Bin Laden: filho da América

Como diria o velho Winston Churchill, estadista britânico e primeiro ministro do Reino Unido durante Segunda Grande Guerra, “você sempre pode contar com os Americanos para fazer a coisa certa, depois que eles tentaram todo o resto”. A morte (ou assassinato) de Bin Laden foi mais um movimento desastrado dos ianques? Ainda é cedo para saber.

O anúncio do assassinato de Osama Bin Laden, ocorrido na madrugada do domingo, 1º de maio, levou o povo estadunidense a uma euforia que beirou a completa ausência de crítica. Às gargalhadas e dançando num movimento quase irracional, os norte americanos finalmente tiveram a notícia da morte do inimigo número 1 da América.

É de uma clareza solar que o assassinato de Bin Laden respondeu muito mais a um sentimento de vingança do que à uma questão de justiça, o que levaria o terrorista a um tribunal. O assassinato puro e simples serviu muito melhor à moral do povo americano do que um julgamento. Devemos refletir, contudo, que os americanos dançaram sobre o cadáver de um filho da América estadunidense, quando comemoraram a morte de Bin Laden. Vejamos o motivo.

Durante a Guerra Fria, o mundo dividiu-se em duas bandeiras, a vermelha, do comunismo soviético, e a da liberdade, capitaneada pelos EUA. O Afeganistão foi palco em 1979, de um golpe militar que levou ao poder grupos ligados à União Soviética. Instado pelo seu assessor de Segurança Nacional, Zbigniew Brzezinsky, o então presidente dos EUA, Jimmy Carter, buscou reinstalar em Cabul, capital afegã, um governo simpático aos americanos e anti-soviéticos. Ao invés de apoiar seculares grupos nacionalistas do país asiático, opositores de Moscou, a América preferiu apoiar as organizações afegãs mais fundamentalistas, reunidas, desde 1983, na Aliança Islâmica do Mujahedin Afegão (IAAM, em inglês).

O apoio era bélico e financeiro. Mais de US$ 20 bilhões de dólares jorraram dos cofres Norte Americanos, somados a igual quantia “doada” por príncipes sauditas, bilhões devidamente direcionados para recrutar e formar guerrilheiros, fanatizados e armá-los até os dentes. Os ideólogos americanos faziam sua parte, valorizando ao máximo, aos cooptados, a Jihad (guerra santa) contra o governo ateu de Moscou.

Esse movimento levou o milionário Bin Laden, saudita, a aproximar-se do Afeganistão e, por consequencia, dos dirigentes do IAAM, que posteriormente alcançaram o poder, com apoio da Casa Branca, constituindo-se o governo “Talibã”. Bin Laden estava fascinado pela jihad patrocinada pelos EUA, dando e recebendo apoio.

Com o colapso do governo pró-soviéticos e da própria URSS, os então “rebeldes” voltaram para seus países de origem. Bin Laden voltou para a Arábia Saudita, então submissa aos EUA. Somado a isso, os Americanos descumpriram a promessa de retirar as tropas daquele país, após a guerra do Golfo.
A Arábia Saudita é o país onde estão as cidades sagradas de Meca e Medina, bem como estavam as bases militares e os milhares de soldados mobilizados contra Saddan Hussein. Bin Laden e seus liderados lembraram que isso contrariava a Sharia, lei islâmica. Após diversos desentendimentos, Bin Laden é expulso de seu país (1994), afirmando que “expulsar o ocupante americano é o mais importante dever dos muçulmanos, depois do dever da crença em Deus”. Uma frente de fundamentalistas formada por Bin Laden, dois anos depois, divulgava que “a determinação de matar os americanos e seus aliados — civis e militares — é um dever individual para todo muçulmano que possa fazê-lo em qualquer país”.

Cooptado, ensinado, treinado e traídos pelos EUA. Assim sentia-se Bin Laden, filho da insanidade e intolerância de Washington.

“As religiões, assim como as luzes, necessitam de escuridão para brilhar” (Arthur Schopenhauer). Trata-se de um ponto de vista. Assim como Obama e todo estadunidense pronuncia, à guisa de retórica comum, "Deus salve a América", os extremistas islâmicos proclamam a Jihad (guerra santa) como movimento abençoado por Alláh. Tanto o Deus do ocidente quanto Allah necessitam, nesse jogo político, um do outro para existirem. Muito aquém da função de “salvador”, nessa dança, o "Todo Poderoso" torna-se um útil instrumento político. A questão é: estaria ele de olhos abertos?

Texto publicado na revista Outdoor Regional de 07/05/2011

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