A cumplicidade vergonhosa

"Entre um governo que faz o mal e o povo que o consente, há uma certa cumplicidade vergonhosa."
Victor Hugo

Há no mundo uma decadência que atinge o ser humano no sentido de o desumanizar, torná-lo uma coisa, coisificá-lo. Esse movimento utiliza o capital como motor propulsor, alimentado pela enorme falta de consciência dos homens e mulheres que se deixam instrumentalizar por essa ordem capitalista que não é tão nova assim.


"O governo que faz o mal", o fez e o faz assentado na inconsciência dos povos e por meio dela. A ordem econômica que rege a vida dos habitantes deste planeta deixou se ser instrumento de produção de riqueza para ser a "alma", aquilo que anima os corpos sociais e, como tal, portadora da capacidade de "deixar de animar", ou deixar apodrecer, aquelas parcelas que entende como desinteressantes ou economicamente perigosas.


Vejam que, em certa medida, esse cumplicidade está profundamente vinculada ao egocentrismo dos povos instrumentalizados: quando dão-se com o cenário econômico favorável, tratam de consumir de forma desenfreada, irresponsável, quase animalesca, como abutres sobre a carcaça. Deixam-se seduzir pelo deus das realizações imediatas e colocam sua própria existência, que exige cuidados constantes, em xeque.

A crise econômica mundial é o exemplo perfeito disso: atender os interesses empresariais de lucro fácil sem produção de riqueza, embotando a razão dos cidadãos contribuintes com promessas falsas de realizações materiais, foi a forma como diversos governos do mundo agiram, traindo seus interesses pátrios em prol do motor do capital, que se mostrou ultrapragmático e desprovido de "pena", de "compaixão" para com aqueles povos e países que se deixaram ludibriar pelo brilho das moedas.

Alertas diversos sobre o que o consumismo desenfreado traria foram dados, portanto, culpados são tanto os governos quanto os cidadãos em relação a esta crise, só mais uma dentre tantas passadas e vindouras.

A questão não é apontar quais governos são mais corruptos, ou se este ou aquele povo está mais mancomunado com os interesses espúrios do seu governo, prostituta moral dos conglomerados empresariais internacionais.

A questão é ver qual povo está mais consciente das razões históricas que promovem essa cumplicidade vergonhosa e demonstrar que a realidade que se vive é apenas a consequência de que a consciência, por sí só, sem ação positiva, não gera resultados favoráveis, e que essas consequências devem ser suportadas e superadas justamente através dessa consciência, sem a intenção, ou prática, de socializar a miséria moral na qual chafurdam esses povos tidos como"conscientes" e desenvolvidos, mas que carregam a inconsciência como elemento existencial fundamental.


Que os resultados da ganância internacional sirvam como exemplo para os brasileiros, que incorrem no mesmo erro de povos de outros países, que se endividaram de forma assustadora e hoje colhem os frutos podres do mercado.

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