Uma onda de manifestações contra “tudo o que está errado”
vem varrendo o país nos últimos dias. Não há dúvidas de que vem sendo a maior
movimentação popular política espontânea, desde o movimento “Diretas Já” (que
lutava pelo voto direto, popular e democrático), que já ocorreu no Brasil.
O levante das massas não é à toa. Escorrem pelo subsolo do
país, há centenas de anos, toda sorte de sujeira que seres humanos podem
imaginar e, pior, realizar. Corrupção, falta de competência administrativa,
distribuição desigual de riquezas, pouco investimento público em saúde,
educação e segurança, são exemplos que fermentam há décadas no estômago do
brasileiro.
Claro que o resultado de tantos desmandos, cedo ou tarde,
seria o levante revoltoso de um dos povos mais pacíficos do mundo, que saiu às
ruas para protestar contra tudo.
Mas o problema de tiro que não tem destino certo é acertar o
alvo errado, e centenas de vândalos acabaram se infiltrando nesses movimentos e
depredando patrimônio público a privado, ameaçando desqualificar a luta
legítima de estudantes, pensionistas, aposentados e trabalhadores, que vêm seus
esforço sendo minados pelos desmandos seculares: no Brasil, sempre “mandou quem
pode, obedeceu quem teve juízo”.
Parece que finalmente chegamos a um novo estágio de
maturidade democrática, alcançado há décadas em países desenvolvidos: não ver a
corrupção e o desmando como naturais do sistema político vigente. Afinal, em
uma democracia, o povo é quem manda, e o político obedece se tiver juízo. E se
não tiver, que saia de seu cargo público e vá para a iniciativa privada, onde
ele administra o que é dele, e não o que é de todos.
É óbvio que existem problemas no levante popular que não
foram solucionados até agora: se tudo está errado, isso se deve ao modelo de
sistema vigente. Mas qual é a alternativa a esse modelo? O que colocar no lugar
dele?
O Governo Federal já acenou com uma possibilidade de
plebiscito, para construir os alicerces da reforma política, desejada há anos
pelos eleitores. É viável de fato esse plebiscito? Qual será a validade de
respostas mutuamente excludentes (sim ou não) para problemas extremamente
complexos? Pensadores e juristas discordam de ser esse o melhor caminho. Alguns
acreditam que o Congresso Nacional deva fazer a melhor reforma política
possível e depois submetê-la ao povo que, em plebiscito, escolheria se a
acatariam ou não.
O problema é a palavra “possível”. Existem muitas
possibilidades e nenhuma delas simples para fazer a reforma. E dificilmente o
povo teria em mãos um resultado 100% bom, e mesmo assim teria de escolher por
um “sim”, sob pena de jamais chegar a um final satisfatório.
Já o Governo Estadual resolveu cortar na carne seus gastos,
vendendo helicóptero, devolvendo carros alugados, diminuindo secretarias e
extinguindo cargos comissionados. O que o cidadão pensa é: ora, se o governo
pode fazer esses cortes, por que não os fez antes? Os gastos nesses anos todos
foram à toa?
Fato é que as manifestações demonstraram aos políticos de
todas as esferas que o povo está descontente com os rumos que cidades, estados
e país vêm tomando, e que as coisas não podem ficar como estavam, sem qualquer
alteração.
Cabe agora encontrar um caminho, capaz de dar conta de uma
nova maturidade democrática do povo, que canalize os esforços para resolver os
grandes e os pequenos problemas nacionais, regionais, locais. Seja qual for o
caminho, que seja democrático e acima de tudo, popular, com o cidadão assumindo
o papel que lhe cabe dentro desse sistema, e os tomadores de decisões ouvindo
os clamores legítimos emanados da população.
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